sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Musicais e pça. Roosevelt discutem relação


A convite da Folha, Saulo Vasconcelos, de "Mamma Mia!", e Rodolfo García Vázquez, dos Satyros, veem espetáculos um do outro

Após a recusa de um expoente "alternativo" para o "confronto", ator de musicais convence o diretor dos Satyros

Daniel Marenco/Folhapress
Cena do musical "Mamma Mia!", que estreia na próxima quinta, noTeatro Abril



GUSTAVO FIORATTI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA


De um lado, Saulo Vasconcelos, 36, espécie de Tarcísio Meira dos musicais de São Paulo, voz encorpada de um Fantasma da Ópera e sorriso de comerciais.

Do outro, Rodolfo García Vázquez, 48, rei do teatro marginal da praça Roosevelt, pé de chinelo que vive colocando atores nus no palco de seu Espaço dos Satyros em situações que ele insiste em vender como arte.

A convite da Folha, um foi apreciar o trabalho do outro. Não como adversários, mas como símbolos díspares de uma mesma expressão artística a que chamam por aí de teatro.

Reconciliar diferenças estéticas pode não ser fácil. A última esperança, então, recai sobre uma possível DR. A portentosa discussão de relacionamento que vem se adiando desde que a Broadway e os experimentais resolveram ganhar corpo numa cidade aberta a todo tipo de espetáculo.

Mário Bortolotto, o dramaturgo que tomou três tiros e não morreu, foi o primeiro a ser convidado para a experiência. "Não tenho vontade nenhuma de ver um musical. Se fosse um trampo, eu até suportaria, mas tenho mais o que fazer numa terça-feira à noite", respondeu ele à reportagem, por e-mail.
Mas os mauricinhos dos musicais não vão a nocaute: mesmo a par da recusa de Bortolotto em ver seu trabalho, Vasconcelos aceita fazer a visita ao reduto dos alternativos num sábado.

Num golpe de mestre, ele mesmo convida o diretor do grupo Os Satyros ao "duelo". Democrático, García Vázquez não soube dizer não.


"Queria trabalhar num espetáculo assim", diz ator


Uma semana antes de estrear, na próxima quinta, em "Mamma Mia!", peça com canções do Abba, Saulo Vasconcelos decidiu enfrentar o desafio. Escreveu à Folha a seguinte mensagem: "Hoje é meu único dia de descanso, mas acho importantíssima essa oportunidade, que pode vir a derrubar esse preconceito dos dois lados. Me diz onde, a que horas e o nome da peça".

Às 21h, no Espaço dos Satyros, ingressos de R$ 5 a R$ 40. O ator foi de camisa bem passada. Deu R$ 10 para um mendigo sem o braço esquerdo, que passou em frente ao teatro na praça Roosevelt. O pedinte desacreditou.

Na sala de 50 lugares, assistiu a "Roberto Zucco", produção que não chega a R$ 5.000 sobre um serial killer que matou os pais e saiu andando por Paris.

Vasconcelos gostou especialmente da forma como a encenação ocupa o espaço de 60 m2. As duas arquibancadas que formam a plateia se movimentam sobre rodas. Com o público sobre elas, as estruturas modulam diversas possibilidades espaciais.

"Queria muito trabalhar num espetáculo como esse", aplaudia o ator, ao fim da sessão. "O problema é que financeiramente não dá."

De fato, nenhum dos 20 atores é pago pelo trabalho. Há um ano, atuam em regime de saltimbanco. A companhia, diz o diretor Rodolfo García Vázquez, está no fundo do poço, depois de três anos sem vencer editais de fomento à produção teatral.Nos musicais da T4F, desses em que Vasconcelos atua, dificilmente um intérprete ganha menos de R$ 4.000 mensais.

Saulo ajeitou uma cadeira de plástico desparafusada e deixou a plateia com cuidado para não cair no vão entre as arquibancadas de madeira.
Fez questão de dar os parabéns a García Vázquez, dizendo: "Minha cabeça não para de pensar no que vi".

O que faz falta ao ator, diz, é participar mais efetivamente da criação da montagem. "Num musical, o trabalho de certa forma já vem pronto dos EUA. É possível fazer uma contribuição pessoal como intérprete, mas não existe esse workshop que se vê numa peça experimental."

Foi a primeira vez que Vasconcelos entrou no espaço que há dez anos deu início à ocupação teatral da praça Roosevelt. Antes, o local ambientava ponto de tráfico de drogas e prostituição. (GF)

RAIO-X SAULO VASCONCELOS

VIDA
Natural de Brasília, 36 anos, é formado em canto lírico

OBRA
Há doze anos se dedica a musicais. Atuou em várias óperas, entre elas "O Barbeiro de Sevilha", regida por Marconi Araújo. Protagonizou duas montagens de "O Fantasma da Ópera" e participou de espetáculos como "A Noviça Rebelde" e "Les Misérables"

OUTROS TRABALHOS
Lançou o CD "Pretty Words", com canções de musicais


RAIO-X RODOLFO GARCÍA VÁZQUEZ

VIDA
Paulistano, tem 48 anos e é formado em administração pela Fundação Getúlio Vargas. Em 1989, fundou Os Satyros com Ivam Cabral

OBRA
Como dramaturgo, escreveu "Kaspar ou a Triste História do Pequeno Rei do Infinito Arrancado de Sua Casca de Noz" e "Transex", entre outras

PRÊMIOS
Dirigiu "A Vida na Praça Roosevelt", pela qual recebeu um Shell, prêmio ao qual foi indicado outras três vezes como diretor


Diretor compara "Mamma Mia!" com filme da Xuxa







Rodolfo García Vázquez não vê glamour em ser convidado para a pré-estreia de um musical da Broadway em São Paulo.

Os aproximados 2 km do percurso de sua casa, que fica no baixo Augusta, até o teatro Abril, na Bela Vista, ele fez a pé. O diretor e dramaturgo chegou quase na hora do espetáculo, um pouco suado. A barra da calça jeans mal feita e carcomida na parte dos calcanhares.

Foi sua primeira investida no universo da Broadway paulistana. A peça é "Mamma Mia!", cuja versão original ele viu em Nova York.

García Vázquez estava especialmente ansioso para ouvir Abba em português. No primeiro ato da peça, gargalhou com a tradução dos versos "You can dance/ you can jive", de "Dancing Queen": "Vem dançar/ a valer/ hoje a rainha é você".
Ao ver a interpretação da canção "Chiquitita", fez sua primeira observação. "É bem mais engraçado do que a americana. Está diferente."

As montagens da produtora TF4, importadas em sistema de franchising, costumam ser fiéis ao original. Pela primeira vez, os intérpretes brasileiros parecem mais soltos. O cenário, no entanto, permanece igual.

Rodolfo considerou o primeiro ato divertido. Mas, no intervalo, fez críticas. "Essa produção deve ser absurdamente cara. Não entendo como é permitido montar um espetáculo desses, que visa ao lucro já na concepção, com dinheiro de dedução fiscal [via Lei Rouanet]."

A produção de "Mamma Mia!" não revela o valor investido no espetáculo. Mas, pelo site do Ministério da Cultura (MinC), é possível ver que a T4F solicitou captação de R$ 16,9 milhões com o benefício da Lei Rouanet -pela qual empresas podem destinar à produção cultural parcela do Imposto de Renda devido. O MinC aprovou captação de R$ 13,39 milhões.

Os ingressos custam entre R$ 80 e R$ 230.

Durante o segundo ato, o diretor pareceu cansado. Bocejou várias vezes, mexeu-se na poltrona, incomodado. Passou a rir mais do comportamento do público do que do próprio espetáculo.

García Vázquez chegou a se divertir com a plateia dançando de pé, ao som dos números que encerram a peça, enfim cantados em inglês.

Saiu de lá comparando o musical a um filme da Xuxa. Considerou a montagem eficiente como entretenimento. Nada contra a diversão pura, mas também nada mais do que isso. (GF)


14 comentários:

  1. Desnecessário o comportamento do Rodolfo García Velázquez. Tudo bem que os musicais não sejam o tipo preferido de produção dele, eu respeito e aceito isso, mas o comportamento dele diante da apresentação foi completamente desprezível. Uma pena que alguns artistas brasileiros ainda se comportem dessa maneira.

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  2. Nada contra o tipo de teatro que o Velázquez faz, mas alguém q se formou na GV e viu Mamma Mia em NY ñ tem direito algum de querer bancar o 'favelado' da historia... Saulo, como sempre, foi un gentleman e muito nos orgulha com suas atitudes.

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  3. Saulo,não sou um Rodolfo Garcia Velázquez, mas simplesmente adoro musicais!
    Sempre que assisto algum, penso que vale a pena cada minuto e fico muito feliz das minhas filhas poderem crescer (uma já cresceu, 20 anos rs) recebendo esse presente cultural.
    Como gestora de CEU, vibro em cada espetáculo teatral que é apresentado a comunidade local, mas lamento que dificilmente terão acesso aos grandes musicais, pelo menos por enquanto, devido a carência que eles vivem, mas falo por enquanto, pq esses meninos irão crescer e já diferente dos seus pais, pois puderam ter acesso a cultura, sendo assim, acredito que poderão ter maiores oportunidades.
    Desculpe pelas minhas amolações, mas qdo li a reportagem, tive vontade de escrever-lhe.
    Beijos e sucesso sempre!

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  4. Vásquez foi, extremamente, inconveniente no comentário.

    Na minha opinião, a melhor peça é aquela que emociona, inspira, fascina, sendo lúdica ou não, nos faz exercitar um novo olhar.

    E o sucesso dos musicais prova isso.

    Saulo, admirável nos palcos e atitudes...

    Sucesso!!!
    =)

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  5. Achei a matéria mal escrita e tendenciosa. Além de ofensiva para ambos os artistas.
    Acho que vale a pena também ler a resposta do Rodolfo no blog dele.

    Em tempo, sou fã dos trabalhos dos dois.

    Beijos

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  6. Senti enjôo lendo a segunda parte. Sabe, vergonha alheia? Criticar é uma beleza: as pessoas falam meia dúzia de asneiras e em boa parte das vezes ainda é paga por isso(e paga de pobre coitado). Vai entender... Quando realmente algo substancial é dito, de pronto é sobrepujado por algo idiota e 'intelectualóide'...
    Eu me divirto muito, e logo mais quero assistir o musical na íntegra, só para me divertir um pouco mais!
    'A Arte é feita de todas as faces...'

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  7. Acho complicado julgarmos o "Rodolfo". Acho que deveríamos era julgar o jornalista que fez esta matéria. Adorei o Saulo!!! E respeito muito o Rodolfo!

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  8. Este comentário foi removido pelo autor.

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  9. Acho que a crítica é bem vinda quando de fato é crítica, agora, quando se torna galhofa com o trabalho alheio, aí é um pouco demai~s! A pessoa vê o espetáculo em NY, depois aqui (a convite) e tenho certeza que se comportou de maneira muito diferente nos dois momentos, lá, não deve ter rido, nem dos atores nem da platéia, não deve ter ido de calça surrada, não fez tipo carente!
    Eu saio, sim, de casa, muito feliz para ver um musical, que me encanta e sinto muito orgulho de ver tanto talento no palco, com artistas BRASILEIROS, se empenhando para isso! Lamento, muito, que a maioria da população não tenha acesso a estes espetáculos de pura magia!
    Parabéns a você, Maravilhoso, por ser tão encantador, gentil e obrigada por estar aí, nos dando esse presente! E parabéns a todos os envolvidos nesses trabalhos que nos aclentam o coração (eu sei o que esses musicais tem feito na minha vida)

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  10. Muito pertinente a matéria.
    Parabéns Saulo por sua postura e respeito.
    Entendo que cada um tem sua visão e ninguém é obrigado a gostar de tudo.
    Não sou ator de musicais e tb não sou do teatro que fazem na Roosevelt, mas conheço algumas pessoas que fazem trabalho por lá, o que não entendo é como os próprios atores tem preconceito, tudo é arte e cada um escolhe seu caminho. Seja teatro musical, marginal etc... cada um faz o que gosta ou o que é capaz.

    Amo teatro de um modo geral só não vou para os musicais , pois falta de uma voz para cantar kkkk

    A cada dia só aumenta minha admiração por vc e seu trabalho.

    Um grande abraço.

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  11. Parabêns Saulo,
    eu daria tudo pra te ver na platéia do Satyros,
    o teatro lá é algo "pertubador", eles não te entregam a idéia pronta, você tem de entender, particularmente gosto muito, semanalmente dou uma passadinha por lá, muitas peças tem interação com a platéia ( e até interatividade como por exemplo, a peça Hipóteses para o amor e verdade, que ainda está em cartaz e tinha a Luiza que está na Fazenda 3, no primeiro elenco).
    Mas não posso deixar de criticar a posição desnecessária do Rodolfo, tudo é arte, e temos respeitar e parabenizar quando o trabalho é bem feito.
    Saulo...esse papo da peça no Satyros seria muito interessante... .. .

    MERDA!

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  12. Não vejo problema no Rodolfo ir de calça jeans carcomida, como disse o jornalista. Também não vi nada demais nas atitudes do Rodolfo - descrita pelo jornalista. Enfim, apesar de ser a mesma arte, elas são paralelas em suas realizações. O Saulo é um ator-cantor apenas de musicais e o Rodolfo do teatro (chamarei aqui de convencional, mas,usem o termo que acharem necessário) Uma montagem de um peça, não demora mais de duas horas, ao contrário de um musical que pode chegar a mais ou menos 3h, 3h30. O Saulo não faz teatro onde ele precisar ir atras de patrocinio, ficar sem receber. O Rodolfo não faz um musical por motivos que só a ele interessa. E concordo com ele quando diz que ''Não entendo como é permitido montar um espetáculo desses, que visa ao lucro já na concepção, com dinheiro de dedução fiscal [via Lei Rouanet]." Usam dinheiro do Governo Federal para montar algo onde terão seu lucro e ainda por cima cobrar por isso. Lei Rouanet não se deve cobrar do publico. Enfim. Enquanto isso, nas salas da praça Roosvelt, atores não ganham com sua arte...Isso sim é muito sério!

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  13. A existencia de artistas diferenciads em suas escolhas é pressuposto na arte. O único fator lamentável foi o trabalho de GUSTAVO FIORATTI desrespeitoso, preconceituoso e desinformado. Este tipo de jornalismo gratuito e irresponsável me deixa profundamente triste.

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  14. O jornalista sim é ofensivo,chamar o Rodolfo de Pé de Chinelo,o que é isso? Onde estamos? O Rodolfo foi indicado a 3 prêmios Shell por melhor direção e mais duas vezes por iluminação! Um pouco de respeito por favor! Se ele não gostou do espetáculo paciência,foi sincero e é por isso que o admiro,se o Saulo gostou e elogiou é um problema dele,talvez não tenha gostado e elogiou mesmo assim,o que é pior ainda! Sou tor do Satyros a 9 anos e amo o teatro que faço,não estou lá pelo dinheiro!!

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